16.2.09

O Muralismo Ativo de Pavel Égüez

O MURALISMO ATIVO DE PAVEL ÉGÜEZ
Por Nicholas Petrus
Originalmente publicado no periódico Presença de América
2004

A arte Mural é tida como um legítimo movimento artístico latino-americano segundo críticos e historiadores, e nomes como Diego Rivera ou Jose Clemente Orozco sobressaem-se como ícones de um período. Entretanto, os artistas mexicanos marcaram uma época, mas essa arte se expandiu, ultrapassou fronteiras e se mundializou, seduzindo e conscientizando artistas de todos os continentes. Por exemplo, bastante significativo foi o muralismo que se desenvolveu na Nicarágua após a revolução Sandinista já no início da década de 80, e também o muralismo social que se produziu no Equador, principalmente sob influência de Oswaldo Guayasamin.

O muralismo mexicano foi precursor, mas ninguém deu “ordem de descansar”. Muito pelo contrário, esta tradição artística se renovou e o contexto da arte mural se manifesta hoje intrinsecamente conectado ao surgimento, ou “reflorescimento”, das motivações que permeiam as reivindicações sociais que eclodem no planeta após o fim do paradigma do mundo bipolar.

Os ventos sopram por todos os países, reerguendo a voz dos grupos sociais oprimidos, segregados e excluídos. Vozes estavam ocultas pela permanente e “redundante” discussão ente modelos sócias capitalistas e socialista-comunistas. Hoje, é internamente às estruturas de cada país que os segmentos organizados da sociedade se manifestam, cada um lutando pelo reconhecimento de seus direitos, pela construção de novas organizações sociais e por autonomia e/ou autodeterminação.

Nosso continente se abre para perceber que um de nossos maiores problemas é interno: a extrema desigualdade. Este problema é mais grave que nossa posição de países em desenvolvimento e a necessária mudança social ainda nos parece distante. Num cenário de globalização desigual, alguns movimentos nos lembram que outro mundo é desejável, como o movimento dos trabalhadores rurais sem terra no Brasil, os cocaleros do altiplano boliviano, os zapatistas na região dos Chiapas no México, entre outros. Num mundo em que o capital circula em liberdade e globalizam-se as expectativas de consumo, mas não o acesso ao trabalho e a circulação de pessoas, novos conflitos parecem ganhar força, como a exploração do trabalho ilegal boliviano em São Paulo, a luta por trabalho na Argentina, novas políticas de imigração, e porque não lembrar o novo muro global: 3000Km de concreto e ferro que separam os EUA da América Latina.

Neste contexto trabalha o equatoriano Gustavo Pavel Égüez, cuja atuação como pintor e muralista revela o engajamento poético, político e social próprio dos mais refinados artistas de nossa América. Em sua obra, a humildade e a consciência da coletividade prevalecem como qualidades inerentes de um homem que entrega sua alma e seu trabalho aos povos do mundo. Não se trata de produzir uma arte para o Estado, nem para museus, mas da construção de um pictorismo próprio ao Homem, e para o Homem excluído. O poder do agora está numa arte que se volta ao social, especificamente aos grupos sociais, não só no âmbito continental, mas no global.

“Hoy, más que nunca estamos en un mundo atormentado por la pobreza, la injusticia y, contradictoriamente, vivimos la desaforada acumulación de las riquezas en pocas manos, mientras la inmensa población del planeta es excluida de la tierra, del techo, del trabajo, la educación, la salud.”, observa Égüez.

Há mais de 25 anos trabalhando com a consciência de uma necessária aproximação entre arte e cotidiano, Égüez tornou-se o mais ativo muralista da contemporaneidade, tanto pela vastidão temática, quanto à sua produção internacional e também pela sua participação junto aos movimentos sociais, principalmente no Equador. Nos últimos anos vem trabalhando no desenvolvimento de uma linguagem artística que identifique e una os novos movimentos sociais num só grito, ultrapassando fronteiras para atingir o âmago da deficiência social global: o próprio homem. Na festa, na luta, na vitória, na perda, é o próprio homem que produz sua história, motivos que levaram Pavel Égüez a realizar, a partir da série “El Grito de los Excluídos(as)”, uma arte mural fragmentada, exigindo uma responsabilidade global para que este “grito” popular tenha força e sentido.

O Grito dos Excluídos é uma organização continental que tenta chamar a atenção para a crescente exclusão social. Ela começou no Brasil, com um conjunto de manifestações para o dia da pátris, 07 de setembro, em 1995. Em 1999 o Grito se expandiu, tornado-se um grito continental.

Égüez – que trabalhou como adido cultural do Equador em Brasília – se constitui em um interlocutor ativo, que realiza a conscientização política simultanemente à conscientização artística pela produção de uma iconigrafia nova, para os movimentos sociais. “El Grito de los Excluídos(as)” são telas de 142 x 162cm trabalhadas em óleo e granito de mármore, que vão conformando um grande mural global. Estes conjuntos compõem uma unidade a partir de seus fragmentos, numa metáfora em que o artista confere a cada nação, estado, cidade, localidade, a responsabilidade pela totalidade desta ação.

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